4. Definindo critérios para uma cultura de acolhimento
“E o que dizer, mas sobretudo que esperar de mim, se, como professor, não me acho tomado por esse outro saber, o de que preciso estar aberto ao gosto de querer bem, às vezes, à coragem de querer bem aos educandos e à própria prática educativa de que participo. Esta abertura ao querer bem não significa, na verdade, que, porque professor, me obrigo a querer bem a todos os alunos de maneira igual. Significa, de fato, que a afetividade não me assusta, que não tenho medo de expressá-la. Significa essa abertura ao querer bem a maneira que tenho de autenticamente selar o meu compromisso com os educandos numa prática específica do ser humano.” (Paulo Freire. Pedagogia da Autonomia. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2013. 45o edição. Página. 138)
Neste bonito trecho escrito por Paulo Freire, no livro Pedagogia da Autonomia, o bem-querer se apresenta como prática específica do ser humano, e por isso um elemento presente e fundamental nas relações entre professores e alunos.
Acreditamos que o bem-querer se traduz nas práticas do acolhimento, tanto na dimensão de acolher pela escuta e pelo diálogo, como na dimensão de criar um espaço acolhedor para o convívio. Quando praticamos cotidianamente a escuta aberta buscamos entender pontos de vista diferentes dos nossos e construir saberes pela inclusão das diferenças, explicitamos que todas as posições contribuem para um propósito comum de aprendizagem. Isso é exercitar o bem-querer na dimensão das ideias e posicionamentos e alimentar a construção, por parte de alunos e professores, de um sentimento de pertencimento e de atitudes de co-responsabilização.
Mas porque consideramos o acolhimento uma cultura? Podemos considerar cultura todas as práticas que se reiteram no tempo devido a valores que as sustentam.
Vamos refletir sobre essa questão?
Releia o seu registro realizado na atividade anterior, sobre momentos marcantes de acolhimento. Se possível, converse também com colegas e/ou pessoas próximas, convidando-as a compartilharem com você, situações pessoais nas quais acolheram alguém ou foram acolhidas. Quantas vezes situações como essas marcam nossas vidas? Por que são tão importantes para nós? Por que retomamos, na nossa relação com os outros, essas mesmas práticas, oferecendo também acolhida?
Preparamos uma atividade para contribuir com essa reflexão. Ela ajuda a deixar claro como acolher e ser acolhido contribuem para dar sentido às nossas experiências. Explicita também que são práticas retomadas em diferentes momentos, sempre que a vida nos pede. Esse reiterar no tempo e no espaço, aliado a valores fundamentais para nossa experiência, é um elemento importante para pensar em algo como cultura.
Atividade – montanhas e vales
(Inspirado em uma proposta realizada por Marianella Sclavi)
Pegue uma folha em branco e a coloque no sentido paisagem, faça uma linha horizontal no meio da folha, do início ao fim. Esta será sua linha da vida. Agora, volte no tempo e procure em sua memória uma das primeiras experiências em que você se sentiu acolhida ou acolhido para iniciar o exercício – essa será sua primeira montanha. Escreva acima dela qual foi esta situação. Procure retomar, em sua história pessoal, momentos de acolhimento – montanhas – e momentos em que este se fez ausente – vales -, sempre nomeando essas experiências.
Agora, observe pausadamente sua linha da vida e reflita:
- O que há de comum entre as características das situações em que você viveu boas experiências de acolhimento (as suas montanhas)? Elas se mantêm ao longo da vida? Se alteram? Há algo que te chame a atenção?
- E as experiências que não foram boas (os seus vales), o que eles revelam para você? Em quais situações os vales foram mais longos?
Ao longo da linha da vida as situações de acolhimento e os momentos que nos geram a necessidade de buscar acolhimento se transformam, e em algumas situações, aprendemos a exercitar uma postura acolhedora conosco mesmo. Isso aconteceu com você? Ao mesmo tempo, outras são as situações que nos despertam a necessidade de buscar acolhimento. Por isso, ler os nomes de cada montanha e vale nos informa tanto sobre o nosso processo de crescimento pessoal, como nos dá pistas do que temos que zelar em situações de acolhimento com crianças e jovens e nas situações de acolhimento entre adultos.
Registre e guarde essas conclusões no verso da folha em que fez este exercício, pode ser uma boa fonte de autoconhecimento para inspirar você em diferentes momentos da sua vida.